sábado, 18 de dezembro de 2010

Transplante elimina Aids

 
Paciente fica livre do HIV após receber células-tronco em tratamento para leucemia

Um transplante de células-tronco adultas, precursoras de células do sangue, recebido por um paciente com leucemia e Aids acabou por curá-lo não só do câncer como da infecção pelo HIV, anunciaram médicos alemães. Embora este possa ser o primeiro caso em que o vírus foi completamente eliminado do organismo, ele tem particularidades que o tornam único, alertam especialistas.

Além disso, o método é considerado muito arriscado para ser adotado como procedimento padrão, mas indica caminhos que podem ser usados para encontrar uma cura para a doença. O caso foi relatado há dois anos, mas só agora a eliminação foi confirmada.

- É interessante comprovar que medidas extraordinárias podem curar alguém com o HIV. Mas o procedimento é muito arriscado para se tornar padrão - afirma o médico Michael Saag, da Universidade de Alabama, nos EUA, e conselheiro da HIV Medicine Association.

O paciente, um americano na faixa dos 40 anos, vive em Berlim e, em 2007, recebeu um transplante feito a partir de células-tronco adultas retiradas de um doador que, além de compatível, tinha uma mutação genética que lhe conferia uma resistência natural contra o HIV. Agora, três anos depois, ele não tem sinais nem da leucemia nem do vírus.

Transplantes de células-tronco adultas têm sido usados no lugar dos tradicionais transplantes de medula óssea no tratamento da leucemia. Antes de receber o sangue, o paciente teve seu sistema imunológico completamente destruído por radiação e quimioterapia.

- As células do paciente que hospedavam o HIV foram destruídas e, ao ter seu sistema imune repovoado pelas células do doador, essas ainda por cima eram resistentes à infecção pelo vírus. Assim, o HIV não conseguiu infectar novas células e foi eliminado de seu organismo - explica o virologista Amilcar Tanure, do Laboratório de Virologia Molecular da UFRJ.

Para Tanure, o caso é importante por provar que é possível curar a infecção pelo HIV, além de demonstrar que o vírus só infecta células do sistema imunológico dos doentes. Segundo ele, mesmo controlado pelo coquetel de remédios dado aos pacientes com o HIV, o vírus permanece escondido no corpo, associado ao genoma de células do sistema imunológico, ressurgindo depressa se o tratamento for suspenso.

- São células como linfócitos e macrófagos que guardam memória, como no caso da imunidade conferida por vacinas - conta. - Não se sabia se a quimioterapia era capaz de matar todas elas. Além disso, havia a teoria de que o HIV podia infectar outros tipos de células do organismo que não as do sistema imunológico.

Pelo jeito, isso não é verdade. De acordo com o virologista, o método que curou o americano não é prático nem seguro o bastante para ser usado de forma ampla. Ele lembra que pessoas sem grau de parentesco têm apenas uma chance em 10 mil de serem compatíveis para o transplante de células-tronco sanguíneas.

Some-se a isso o fato de só uma em cada cem terem a mutação que dificulta a proliferação do HIV e as chances de o procedimento ser replicado caem para pelo menos uma em um milhão.

Isso sem contar que o risco de mortalidade por complicações do procedimento é de aproximadamente de 5%.

- Esse caso é muito particular. Ninguém vai ficar fazendo transplantes de células-tronco a torto e a direito para tratar o HIV - avalia. - Mas o achado abre caminho para pesquisas sobre como eliminar o HIV. Pode-se, por exemplo, desenvolver uma droga que só mate essas células latentes do sistema imunológico que abrigam o HIV. Associando ela ao tratamento antirretroviral, talvez se consiga eliminar o vírus em outros doentes. De qualquer forma, a descoberta é um alento para a comunidade científica ao mostrar não se está correndo atrás de uma miragem ao se tentar eliminar o vírus.
(César Baima)
(O Globo, 16/12)

Alemanha busca cientistas em todo o mundo para avançar

Preocupada com o cada vez menor número de nascimentos no país e com a qualidade do ensino, a Alemanha está investindo para atrair jovens cientistas e se tornar uma das três potências científicas do mundo até 2020. A falta de profissionais pode chegar a 480 mil pessoas

Conhecida por ter um rígido controle migratório, a maior economia da Europa está se abrindo a estudantes. Devido à baixa natalidade registrada desde os anos 1990, os alemães estão de olho em jovens cientistas de diversas partes do mundo, ao mesmo tempo em que investem para melhorar a qualidade do ensino básico e universitário.

"Atrair cientistas é vital", afirmou a ministra da Educação e Pesquisa, Annete Schavan, durante a cerimônia de entrega do prêmio Talentos Verdes, uma das iniciativas de atração de pesquisadores estrangeiros. "A Alemanha precisa se abrir para o mundo e ter pesquisadores curiosos. Temos objetivos ambiciosos e queremos liderar a pesquisa no mundo", complementa.

As metas para que o plano saia do papel são de médio e longo prazo. Se por um lado os investimentos em educação, ciência e tecnologia estão crescendo nos últimos anos e o governo estimula indústrias de ponta, com alto grau de conhecimento aplicado, como nanotecnologia e energias renováveis, por outro, problemas demográficos tornam a tarefa mais árdua.

A dificuldade com a demografia se deve principalmente à baixa taxa de natalidade verificada no país. Lá, cada mulher tem, em média, 1,41 filho, contra 2,21 no Brasil. O número faz com que a reposição de estudantes seja pequena e a média de idade do país seja alta - 44 anos, contra 28,9 no Brasil.

"Em dez anos, quando as atuais crianças se tornarem adolescentes, começaremos a sentir falta de trainees e depois de equipes qualificadas", alerta relatório do Ministério da Educação e Pesquisa.

O quadro é agravado quando se olha para o número de jovens que deixam os estudos precocemente - 8% dos estudantes largam a escola antes de terminar o equivalente ao Ensino Fundamental, percentual considerado alto para padrões europeus.

Dados do Centro de Pesquisa para a Economia Europeia prevêem que a Alemanha demandará entre 180 mil e 480 mil profissionais qualificados até 2014, devido ao envelhecimento da população e mudanças estruturais na economia.

As áreas mais afetadas são matemática, informática, ciências naturais e tecnologia, principalmente em nível técnico. Segundo a Associação de Câmaras de Comércio da Alemanha, 50% das empresas relatam problemas para contratar mestres ou doutores.

O diretor da Universidade do  Instituto de Física Experimental da Universidade Técnica de Freiberg, Hans Möller, já sente na pele a falta de estudantes e profissionais. "Temos problemas sobretudo na Alemanha oriental, onde as pessoas preferem ir para o lado ocidental em busca de melhores empregos e qualidade de vida", relata. "Faltam estudantes, pesquisadores, pessoal de laboratório e técnicos."

Em reação a isso, as empresas oferecem treinamentos internos (51% já possuem programas próprios) e contratam pessoas com mais de 55 anos. Mas, para Möller, essas medidas não bastam: "não vejo outra saída se não buscar gente talentosa em outros países".

Competição - Para ultrapassar as barreiras postas ao desenvolvimento econômico, os alemães decidiram entrar na competição internacional por jovens talentos. Hoje, segundo dados recolhidos pelo instituto Hochschul-Informations-System (HIS), sob encomenda do Serviço de Intercâmbio Acadêmico Alemão (DAAD), dos dois milhões de universitários no país, 240 mil são estrangeiros. A China lidera a lista de origem dos alunos, seguida por Turquia, França e Polônia. O Brasil ocupa a 26ª posição.

Além disso, 8% dos professores de nível superior e 15% dos pesquisadores são estrangeiros. Já em cursos de doutorado, 20% dos estudantes são de outros países, o que deixa a Alemanha na 15ª posição no ranking da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Em 2009, havia 359 doutorandos brasileiros entre os alemães.

A intenção é crescer, mas não há percentuais definidos. De 2008 para 2009, o número de estudantes estrangeiros na Alemanha cresceu 10%.

O país, no entanto, ainda fica atrás dos países anglófonos na escolha feita por pesquisadores internacionais para trabalhar. As razões vão de prestígio (a universidade alemã mais bem colocada no ranking do jornal inglês The Times é a de Göttingen, na 43ª posição) a dificuldades com a língua. Não à toa, muitas universidades já oferecem cursos de pós-graduação em inglês e desenvolvem ações de marketing mundo afora.

Bolsas - Do lado governamental, a oferta de prêmios e bolsas de estudos é crescente. "Premiamos a excelência em pesquisa, claro, mas sobretudo a criatividade. Com os prêmios, a Alemanha ganha visibilidade internacional. Os premiados podem voltar para completar seus estudos, porém o mais importante é desenvolvermos redes com o que há de mais avançado no mundo", afirma Reinhard Hüttl, diretor-executivo e científico do Centro de Pesquisas de Geociências da Alemanha, em Postdam.

China, Brasil e Índia são os países prioritários no mundo em desenvolvimento. A brasileira Juliana Lima é uma das que entrou na rede alemã. Doutora em química pela Universidade de Campinas (Unicamp), ela foi uma das vencedoras do Prêmio Talentos Verdes em 2009 e agora faz seu pós-doutorado no Instituto Max Plank para Pesquisa de Polímeros.

Atraída por uma bolsa de 3.200 euros mensais e condições de trabalho sem igual no Brasil, ela pensa em se estabelecer na Europa. "O laboratório da Unicamp não deve nada ao daqui, mas na Alemanha não há burocracia para se obter material e eles são mais abertos a trabalhos criativos", relata.

Migração

O Estado alemão busca também soluções no campo jurídico. A fim de atrair estudantes e pesquisadores para universidades e empresas, as rígidas regras de imigração foram flexibilizadas. A intenção é desestimular o retorno de pesquisadores qualificados a seus países - alguns governos incentivam os emigrados a voltar com altos rendimentos e promessas de melhores condições de pesquisa - e tornar a Alemanha um país mais atrativo para quem tem qualificação acadêmica.

Estrangeiros formados em universidades germânicas têm um ano para buscar emprego no país e contam com ajuda de uma agência estatal para isso. Já para os pesquisadores, o salário necessário para ganhar um visto de residência permanente caiu de 86.400 para 64.000 euros anuais, valor considerado ainda alto pelos críticos.

Também foram suspensas medidas de reserva de mercado, apesar de, em algumas áreas, a contratação de estrangeiros ainda estar vinculada à inexistência de mão de obra local.

Ao mesmo tempo, o governo tem buscado fortalecer redes internacionais de pesquisa, a fim de economizar recursos e estar atento a pesquisas de ponta que estejam sendo feitas em qualquer lugar do mundo.

Outro objetivo é manter pesquisadores alemães no país, uma vez que muitos vão principalmente para os EUA e a Inglaterra em busca de melhores oportunidades - cerca de 20 mil pesquisadores germânicos trabalham hoje no exterior.

Crise não impede aumento de investimentos em educação

A busca por melhorias na educação e no desenvolvimento da ciência na Alemanha não foi afetada pela crise financeira mundial. O governo federal, com apoio dos estados, lançou uma série de iniciativas nos últimos anos para estimular a pesquisa e a melhoria da qualidade educacional no país.

Entre elas está o programa "Indo adiante por meio da Educação", de 2006. Voltada para melhorar a qualidade do ensino em todas as áreas do conhecimento e níveis, a iniciativa promete elevar os investimentos em educação para 10% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2015 (em 2007 era de 4,4%).

Além dessa iniciativa, o segundo pacote de estímulo econômico, lançado no fim de 2008 para tentar recuperar a economia após o baque daquele ano, previa gastos de 8,6 bilhões de euros em 2009 e 2010 na reforma de jardins de infância, infraestruturas de escolas, instituições de ensino superior e museus.

O objetivo é melhorar a qualificação dos alemães. Até 2015, o governo federal e os estados pretendem diminuir a evasão escolar de 8% para 4% e a quantidade de jovens adultos sem qualificação profissional de 17% para 8,5% da população economicamente ativa.
(Marcelo Medeiros, do Jornal da Ciência)

Nota da redação: Esta reportagem foi originalmente publicada na edição 680 do Jornal da Ciência, que tem conteúdo exclusivo em sua versão impressa. Informações sobre como assinar a publicação podem ser obtidas pelo e-mail jciencia@jornaldaciencia.org.br ou pelo fone (21) 2109-8989.

Florianópolis sediará fórum mundial de educação tecnológica

2º Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica está previsto para novembro de 2011

O conselho internacional do Fórum Mundial de Educação (FME), reunido no domingo, dia 12, em Santiago de Compostela (Espanha), aprovou por unanimidade a escolha de Florianópolis (SC) como sede do 2º Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica. O encontro está previsto para novembro de 2011.

Com a escolha da capital catarinense, será possível instalar o comitê organizador, formado por entidades e instituições parceiras. Elas serão responsáveis pelo encontro, ao lado do Ministério da Educação (MEC) e do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina.

O conselho internacional do FME reuniu-se durante o Fórum Mundial de Educação Temático (FMEt), em Santiago de Compostela. No encontro, que termina nesta segunda-feira, dia 13, foi debatido o tema "Educação, Pesquisa e Cultura de Paz", com a participação de representantes do Brasil, Uruguai, Espanha e Colômbia.

Na abertura oficial, na sexta-feira, dia 10, o ex-presidente e ex-primeiro ministro de Portugal Mário Soares defendeu a educação para a paz como disciplina curricular obrigatória em todos os países. Segundo ele, o assunto deve ser prioritário na agenda das nações, de forma a contribuir para regular "a globalização desenfreada".

O presidente da Fundação Cultura de Paz, o espanhol Federico Mayor Zaragoza, afirmou que a sociedade civil deve apoiar-se nas tecnologias da comunicação para dizer basta à violência. "Os cidadãos podem ser fontes de informação, ajudando os jornalistas a escrever o mundo tal como tem de ser", disse.

O representante do Ministério da Educação brasileiro, Alexandre Vidor, destacou o papel da rede federal brasileira de educação profissional na construção de uma cultura da paz. "A revolução que está em curso no Brasil nessa área dá o protagonismo ao indivíduo", disse. "Devemos, sempre, reafirmar que a formação cidadã deve preceder a capacitação para o mercado de trabalho."

Realizado pela primeira vez em 2001, em Porto Alegre, o FME reúne dirigentes e organizações de todos os continentes para articular e democratizar conhecimentos e experiências. A proposta do fórum é a construção coletiva de uma plataforma internacional de defesa da educação pública, gratuita, laica, obrigatória e de qualidade e que promova a cultura de paz.

Mais informações, http://www.foro2010.org/
(Com informações da Assessoria de Comunicação Social do MEC)
http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=75327

Proteína restaura memória

Proteína restaura memória
Estudo com modelo animal para a doença de Alzheimer consegue avanços ao recuperar a memória e a capacidade de aprendizagem, abrindo caminho para novos tratamentos

Um grupo de pesquisadores do Centro em Ciência da Saúde na Universidade do Texas, nos Estados Unidos, conseguiu restaurar a memória e a capacidade de aprendizagem em um modelo animal da doença de Alzheimer.

No estudo, a recuperação foi verificada em camundongos que tiveram aumentada a quantidade de uma proteína chamada CBP. Segundo os autores, trata-se da primeira demonstração de que a CBP, que libera a produção de outras proteínas essenciais para a formação de memórias, pode reverter consequências da doença hoje incurável.

Os resultados da pesquisa serão publicados esta semana no site e em breve na edição impressa da revista "Proceedings of the National Academy of Sciences".

De acordo com os cientistas, o estudo aponta para um novo caminho para o desenvolvimento de terapias para Alzheimer, forma mais comum de demência que afeta mais de 25 milhões de pessoas no mundo.

Em pacientes com a doença, o acúmulo da proteína beta-amiloide bloqueia a formação de memória ao destruir as sinapses, regiões em que os neurônios compartilham informações. Outra proteína, a tau, forma emanharados neurofibrilares que se depositam no interior dos neurônios.

Aumentar a quantidade de CBP não altera a fisiologia da beta-amiloide ou da tau, mas atua em um mecanismo de recuperação diferente, ao restaurar a atividade da proteína CREB e elevar os níveis de outra proteína, chamada BDNF.

"A CBP pode funcionar como um efeito dominó entre as proteínas que transportam sinais das sinapses aos núcleos dos neurônios. Levar informação aos núcleos é necessário para a formação de memórias de longo prazo", disse Salvatore Oddo, um dos autores do estudo.

O grupo produziu geneticamente um vírus capaz de levar a CBP ao hipocampo, região no cérebro fundamental para a consolidação de memórias e para a aprendizagem.

Aos seis meses de idade, quando a entrega da CBP foi realizada, os camundongos modificados geneticamente estavam com perdas cognitivas semelhantes às verificadas no Alzheimer.

Os animais foram avaliados em um labirinto, onde tinham que lembrar a localização de uma plataforma de saída. Camundongos tratados com CBP foram comparados com outros que receberam apenas placebo e com um terceiro grupo, de animais normais.

A eficiência em escapar do labirinto foi usada como sinal de formação de memória e de aprendizagem. No modelo com Alzheimer, o rendimento do grupo com CPB foi idêntico ao observado nos animais normais, sem a doença, e muito superior ao grupo que recebeu placebo.

O artigo "cAMP-response element binding protein binding protein gene transfer increases brain-derived neurotrophic factor levels and ameliorates learning and memory deficits in a mouse model of Alzheimer's disease" (10.1073/pnas.1012851108), de Salvatore Oddo e outros, poderá ser lido em breve por assinantes da "PNAS" emwww.pnas.org.

(Agência Fapesp, 14/12)