Lei do Gás reúne as bases para estimular o desenvolvimento consistente de toda a cadeia do gás natural e cria um ambiente favorável para a atração de novos investidores Arnaldo Jardim, para a Agência CanalEnergia, Artigos
16/02/2009
A aprovação da Lei do Gás, em dezembro passado, representa um divisor de águas na história do gás natural no País. O marco regulatório, que aguarda sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e deve ser regulamentado nos próximos meses, contribuirá para aumentar a segurança de suprimento e reduzir os custos do combustível, impulsionando o aumento da sua participação na matriz energética brasileira. O texto conjuga argumentos técnicos e a necessária segurança jurídica, de forma a alinhar interesses econômicos, o compromisso com o crescimento e os benefícios para a sociedade civil.
Muitas rodadas de negociações se fizeram necessárias para acomodar de forma técnica e legalmente consistente anseios do governo federal, dos governos estaduais, do setor privado e da Petrobras. Por isso, a tramitação da Lei do Gás enriquece o cenário parlamentar brasileiro e enobrece o esforço de todos os interessados em sua aprovação. Para nós que participamos diretamente do processo fica a sensação de dever cumprido. Mas, além de evidenciar a maturidade política brasileira, a lei é fundamental por aportar evoluções ao mercado. A introdução das definições do consumidor livre, autoprodutor e auto-importador de gás no texto legal permitirá que grandes empreendedores possam construir gasodutos para uso próprio, bem como o desenvolvimento de um mercado livre de gás, nos moldes do existente no setor elétrico.
É importante ressaltar que essas definições também precisam ser incluídas nas regras dos estados, já que estes são responsáveis pelo setor de distribuição. Além disso, precisam ser incluídas nos contratos de concessão das distribuidoras. Nesse sentido, a nova legislação apresenta um alinhamento da visão econômica do setor sem invadir a competência dos estados, com clara definição das figuras jurídicas e respeito à Constituição.
O desenvolvimento do mercado livre de gás também deve ser estimulado pela possibilidade, prevista na lei, de compartilhamento dos gasodutos de transporte. Uma mostra disso é que os gasodutos existentes e em fase de licenciamento ambiental terão dez anos de exclusividade de uso por quem os construiu. Passada essa fase e havendo disponibilidade, outros transportadores terão o direito de usar a infra-estrutura, remunerando o proprietário das instalações e eventualmente vendendo o gás diretamente para grandes consumidores.
Isso deve estimular o ingresso de novos investidores no setor de transporte, assim como as novas regras para construção de novos gasodutos. A lei prevê que a construção de gasodutos que envolvem acordos internacionais ou interesses de um único usuário deve ser regida por autorização, enquanto os dutos de interesse público passarão a ser motivos de concessões. Semelhante ao regime adotado no segmento de transmissão de eletricidade, esse modelo de concessões deve garantir a entrada de novos agentes no segmento, colocando fim ao monopólio que, na prática, a Petrobras hoje detém sobre o sistema de transporte de gás.
Para que tudo isso funcione, no entanto, é imperioso que a atuação da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) seja pautada por um controle rigoroso de todas as atividades, as quais precisam ser fiscalizadas, para coibir condutas anticompetitivas e fomentar a concorrência saudável no setor.
Além disso, a entrada em vigor do marco regulatório depende de sua regulamentação. A Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados deve acompanhar de perto esse processo, de modo a garantir que todos os avanços incluídos na lei sejam preservados e mais bem detalhados. A expectativa é que os agentes do setor também continuem participando de maneira pró-ativa das discussões.
O trabalho continua, mas já podemos comemorar. Afinal, a Lei do Gás reúne as bases para estimular o desenvolvimento consistente de toda a cadeia do gás natural e cria um ambiente favorável para a atração de novos investidores. Eis aí um raro caso em que a síntese das discussões pode resultar em um ponto de equilíbrio a favor da sociedade.
Deputado federal pelo PPS-SP, Arnaldo Jardim integra a Comissão Especial da Lei do Gás e é membro da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados. www.arnaldojardim.com.br